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Loose Lips

Devaneios sobre tudo e sobre nada.

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25.Set.18

Pequenez e mesquinhice

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A Federação Académica do Porto organizou, ontem, um protesto simbólico pela falta de alojamento para universitários na cidade (isto é, sem que se comprometam órgãos vitais) e eu acho isto lindo. Acho mesmo! Porque a minha geração raramente se manifesta, mas quando o faz é por causas que valem a pena, como esta, que vale e vale muito.

Mudei-me para o Porto há oito anos atrás, de malas e bagagens para estudar na cidade Invicta, como sempre sonhei. Sabia que ia entrar na Faculdade que queria e, como control freak que sou, tratei do alojamento durante o verão e fartei-me de ouvir comentários que eu era louca, que os melhores quartos apareciam em setembro, que depois conhecia gente na praxe com quem partilhar casa e mimimi, mas eu preferi tratar de tudo antes e, felizmente, os meus pais podiam acarretar as despesas.

No meu primeiro ano de faculdade arrendei um T2 por 550€ para partilhar com mais dois amigos, duas de nós pagávamos 200€ e o que ficava na sala pagava 150€. As despesas eram divididas pelos 3, mas entre Internet, luz, água e gás a coisa ficava ali pelos 250€. A isto somam-se, claro, as despesas normais de transportes, comida e, claro, propinas. Em média eu gastava 450€ aos meus pais, por mês, por estar deslocada. Sou uma priveligiada, bem sei, mas a verdade é, quantas famílias podem suportar estas despesas?! No segundo ano mudei de casa, pagava 200€ por mês pelo meu quarto com despesas incluídas. Felizmente nunca precisei de partilhar quarto porque, à data, estes preços eram os praticados. No meu terceiro ano e pelo facto de ter feito ERASMUS no primeiro semestre, consegui ficar na residência universitária no segundo (que, para quem não sabe, é suuuuuuuper difícil de conseguir lugar, a não ser que sejam das ilhas ou estudantes de doutoramento). Depois disso nunca mais saí da residência, até ter acabado os estudos.

Também a minha irmã foi estudar para o Porto, mas os preços estão bem mais inflacionados agora, com a agravante que a minha irmã estuda num dos pólos da Universidade em que há mais estudantes e, consequentemente, mais procura por alojamento. Não existem quartos por menos de 300€ que não sejam partilhados ou não sejam um anexo de uma casa. 

Não existe pudor nas condições que se oferecem impõem aos estudantes. Não existe respeito. E este protesto simbólico era há muito necessário.

Eu percebo que se queiram rentabilizar os espaços, a sério que sim, mas o que não percebo é esta necessidade de extorsão a famílias que, muitas vezes, fazem um esforço hercúleo na gestão das contas para poderem dar aos filhos as oportunidades que não tiveram.

O que também não percebo é a pequenez e mesquinhice de quem comenta estas notícias nas redes sociais a dizer que é uma questão de prioridades, porque se há dinheiro para festas tem de haver dinheiro para alojamento, que é uma questão de comodidade, porque se arrendarem um quarto em Sobrado só gastam 100€ (podem demorar mais de uma hora em transportes, mas isso agora não interessa nada), que deviam era ir trabalhar para ver o que era bom, porque em 1750 ninguém ia cá para a universidade, trabalhava-se e que, claro, se têm dinheiro para ter um carro têm dinheiro para alojamento (não interessa cá se o carro custou menos que arrendar um quarto). E, claro, não podia faltar o melhor argumento de todos - que é uma pouca vergonha agora NÓS, contribuintes, estarmos a pagar também pelo alojamento dos meninos, quando já lhes pagamos as propinas e eles andam para aí nas praxes e nas festas e depois... PIOR, ainda vão para o estrangeiro com a formação que NÓS lhes pagámos. Quem não adora este argumento, ah? Isto é como dizer aos funcionários públicos que nós é que lhes pagamos os salários e a ADSE... O que não só é falso como é sinal de pequenez e mesquinhice.

 

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Estes comentários demonstram não só a pequenez e mesquinhice destas pessoas, como um completo descrédito dos universitários e do ensino universitário em geral. Em calhando é por isto que, quando saímos da faculdade recebemos propostas de 600€. E aí o que é que a gente faz? Cria aplicações que deitam por terra o trabalho desta gentinha. E depois, esses fazem o quê? Manifestam-se, mas aí já ninguém lhes dá valor.